
Por Fernanda Ripol Cavalheiro
Hoje, quinta-feira, dia 10 de
dezembro, dia internacional dos Direitos Humanos. Uma notícia, veiculada na
página de um jornal local, na verdade mais os comentários em relação à matéria
do que esta em si, prendem minha atenção. A chamada: O Ministério da Saúde
avalia retirar a população carcerária da lista de grupos prioritários para
vacinação contra a covid-19. As avaliações, logo abaixo a postagem, são em sua
maioria favoráveis: “é o mínimo”, “tem que deixar morrer mesmo”, “caso fossem
gente de bem não estariam lá” e por aí vai. Mas uma, que criticava, dizia sobre
o governo deixar claro, com a medida, de que os criminosos estão fora da
prisão.
O comentário me levou ao livro do
Carnelutti, “As Misérias do Processo Penal”. Para quem não é do Direito,
Francesco Carnelutti foi advogado, jurista e professor na Itália e morreu em
1965. Escreveu inúmeras obras, entre elas a que citei acima. Em um trecho desse
livro ele diz que é ilusão pensar que a penitenciária é diferente do resto do
mundo e que a ideia de lá dentro estarem somente os canalhas e fora somente os
homens honestos também. Além disso, é ilusão imaginar que um homem possa ser
totalmente canalha ou totalmente decente. Mais para frente ele ainda diz que
enquanto os homens se julgarem, permanecerão divididos.
É de conhecimento de qualquer um e,
portanto somos coniventes, de que as nossas penitenciárias são as principais
violadoras dos direitos humanos. Não vou adentrar nas inúmeras determinantes
que levam as pessoas a cometer crimes e também não conseguiria desenvolver em
apenas um texto todas as reflexões necessárias para tratar sobre a importância
dos Direitos Humanos, mas resumo afirmando: não, os Direitos Humanos não servem
para “defender bandidos”, e sim, eles são direitos de todos e não cabe a você
julgar quem merece ou não, pois a dignidade humana é algo intrínseco de todo e
qualquer ser e todos devem estar protegidos de qualquer ato de cunho desumano
ou degradante.
Ah, mas vai defender bandido? Quando
permitimos que qualquer pessoa sofra algum tipo de violência, entendo que os
bandidos somos nós. A justiça feita com as próprias mãos não é justiça. Pagar o
mal com o mal está longe de ser justiça. Penso sempre nas pessoas que perderam
algum familiar, vítima de homicídio. A reparação nunca virá, nem com a pena de
morte do autor, caso fosse admitida no nosso país e que muitos desejam. Temos
que lutar é para que isso não aconteça, de forma preventiva, ensinando o ser
humano a respeitar o outro. Mas como fazer isso quando a gente não se vê no
outro né? Como aprender a amar o próximo como a nós mesmos quando somos capazes
de eleger, em meio a uma pandemia, quem não tem, “por mérito” direito à vacina.
Com o tempo percebi que empatia tem
muito mais a ver com responsabilidade do que eu imaginava. É mais cômodo fingir
que não vejo o lixo no chão, afinal não fui eu quem o joguei ali, do que
juntá-lo. Quem tem responsabilidade social carrega um peso muito maior nas
costas, contudo, seguramente tem a alma mais leve. Ao final do livro Carnelutti diz: “Quando
cheguei a reconhecer nos piores presos um homem como eu, quando senti pesar
sobre meus ombros a responsabilidade do seu delito, então entendi que os homens
não se podem dividir entre bons e maus, tampouco presos e livres. Encarcerados
somos todos, mais ou menos entre os muros do nosso egoísmo”. Todas as vidas
importam para você? Então não escolha qual vale mais.